Vicarious Liability
domingo, outubro 12, 2008
  Casamentos homossexuais
O Bloco de Esquerda e os Verdes propuseram. A maioria socialista rejeitou. E o país todo discutiu apaixonadamente, mesmo sabendo previamente qual seria o resultado do debate.
Refiro-me, evidentemente, à legalização dos casamentos entre pessoas do mesmo sexo, reivindicada há algum tempo por alguns sectores do aparelho político e por vezes considerada uma forma de restaurar a “legalidade” violada com a eventual inconstitucionalidade do actual regime gizado pelo Código Civil, à face dos arts. 13º nº 2 e 36º nº 1 da CRP.
A questão não é despicienda e implica que dissociemos pelo menos dois pontos, bem diversos entre si. Um primeiro, estritamente jurídico (ou jurídico-constitucional) de interpretação das disposições constitucionais reguladoras da matéria do casamento com vista a analisar a procedência de uma eventual inconstitucionalidade do regime legal desta matéria; e um segundo, inteiramente político (ou de política legislativa do Direito) referente à oportunidade da alteração do regime legal vigente e à sua adequação aos Direitos Fundamentais dos cidadãos, e ao sistema de valores da sociedade portuguesa em matéria matrimonial.
Relativamente ao primeiro, votamos no sentido da não inconstitucionalidade, interpretando literalmente o disposto no nº 2 do art. 36 que remete para a lei ordinária a definição dos requisitos e dos efeitos do casamento. Segundo nos parece, a articulação sistemática do preceito aponta no sentido de se ter estabelecido uma regra geral no nº 1 (de universalidade e igualdade no acesso ao casamento), concretizada depois pelas disposições seguintes. É com efeito ao legislador ordinário que cabe elencar os requisitos que devem estar preenchidos para o casamento, os efeitos do mesmo e, a contrario, o valor jurídico dos casamentos celebrados com e sem observância desses mesmos requisitos.
Contra esta asserção, não pode, segundo nos parece, opor-se vitoriosamente uma interpretação abrangente do art. 13, nos termos da qual, seriam inconstitucionais as exigências de diferença de sexo entre os nubentes, por violarem o princípio da igualdade na sua dimensão de proibição de discriminação (art. 13/2). Com efeito, conceber esta exigência como uma descriminação dos homossexuais, seria equivalente a aceitar igualmente como discriminações, outros impedimentos legais: a idade superior a 16 anos, seria uma discriminação dos jovens de 15 ou menos anos, a não verificação de parentesco até ao terceiro grau da linha colateral uma discriminação dos nubentes em relação aos quais tal se verificasse, e assim sucessivamente, levando a uma extensão perigosa e disfuncional do princípio constitucional em apreço que, acreditamos, não ser acolhida pelos defensores da teoria da inconstitucionalidade da lei civil.
Acresce que, esta perspectiva de devolução da regulação concreta para a lei civil surge, quanto a nós, como a única que se coaduna com a articulação sistemática entre o âmbito de regulação de Constituição e lei ordinária num Estado de Direito Contemporâneo: ao legislador constitucional cabem as grandes opções a definição dos princípios orientadores da comunidade política; mas é na lei ordinária que se plasmam as soluções concretas, os regimes a aplicar às situações da vida, ainda que não podendo deixar de concretizar as directrizes constitucionais.
Discordamos ainda, com o devido respeito, da orientação veiculada por Jorge Miranda, para quem, a não inconstitucionalidade deveria concluir-se, de uma eventual relação de especialidade entre as regras reveladas pelos arts. 13 e 36 e por uma concepção, pelo legislador constitucional, do instituto do casamento articulado com a constituição de família e com a filiação.
Não cremos que este entendimento possa manter-se apenas com recurso à epígrafe do art. 36. Contra esta leitura devemos opor a necessidade de interpretação evolutiva da Constituição. Além disso, não nos parece sensato que um legislador Constitucional democrático tivesse a pretensão de regular a vida dos cidadãos ao ponto de definir um único modelo de casamento ou um modelo de família compaginável com o texto constitucional. O contrário acabaria por levar a considerar-se de duvidosa constitucionalidade os regimes legais entretanto aprovados para tutelar outros modelos de família diferentes da família “tradicional”, supostamente subjacente ao disposto no art. 36.
A Constituição, mau grado a sua inevitável proximidade com o plano ideológico-valorativo e com o contraditório político, é um texto jurídico, que não pode deixar de interpretar-se de harmonia com os cânones gerais de interpretação da lei, técnicos e ideologicamente desapaixonados.
Já em matéria de política legislativa, somos favoráveis a todas as alterações legislativas que redundem numa maximização do bem-estar dos cidadãos e recusamos, evidentemente, a instrumentalização do Direito por convicções pessoais homofóbicas e discriminatórias. Só duvidamos da prioridade política desta reforma legislativa face a outras que urgem ser concretizadas em sectores mais sensíveis da sociedade…
 
Comentários:
Os homossexuais querem ter o direito de ser diferentes, mas querem ver reconhecido esse mesmo direito! Poderão sempre optar por viver juntos! LOL!
Realmente, não percebo toda esta enorme vontade de casar: as pessoas cada vez casam menos, separam-se mais, quase todos querem ser independentes...
Porque motivo desejam tanto a aprovação pública, legal e social?
Marianne
 
A resposta é muito simples: o fruto proibido é o mais apetecido. Como não podem casar, sentem-se discriminados. Todas as minorias têm uma certa necessidade em se afirmar, quando se esquecem que para haver igualdade, há que tratar de modo igual o que é igual, bem como tratar de modo desigual o que é desigual. Ainda assim, dentro do tema, sempre têm a união de facto (bastante mais simplificada tanto na criação como na desvinculação) para ficarem em paz (salvo seja) uns com os outros.

Beijinhos às primas,
André T.
 
Enviar um comentário



<< Home

Arquivos
  • julho 2006
  • agosto 2006
  • setembro 2006
  • outubro 2006
  • novembro 2006
  • dezembro 2006
  • janeiro 2007
  • fevereiro 2007
  • março 2007
  • abril 2007
  • maio 2007
  • junho 2007
  • julho 2007
  • agosto 2007
  • setembro 2007
  • outubro 2007
  • novembro 2007
  • janeiro 2008
  • fevereiro 2008
  • março 2008
  • abril 2008
  • junho 2008
  • julho 2008
  • agosto 2008
  • setembro 2008
  • outubro 2008
  • novembro 2008
  • dezembro 2008
  • junho 2009
  • Powered by Blogger