Vicarious Liability
segunda-feira, setembro 15, 2008
  Tensão Institucional

A rentrée política deste ano trouxe, para além de habitual troca de acusações entre partido do governo e oposição, uma novidade mediática: a anunciada crise institucional entre S. Bento e Belém, alegadamente despoletada pelo veto político de Cavaco ao Estatuto Político-Administrativo dos Açores, e entusiasticamente amplificada pela comunicação social nos últimos dias.
Ao contrário do que se costuma dizer, Portugal não é um país de brandos costumes, não se dá bem com a tranquilidade e não quer que a estabilidade vá além dos programas teóricos ou dos discursos de campanha eleitoral. Do que todos gostamos é de barulho, de troca de acusações, de apontar culpados, pedir cabeças, e depois vê-las rolar decapitadas, com um prazerzinho sanguinário.
Com efeito, há muito que aguardávamos expectantes a primeira escaramuça institucional desta coabitação que já se temia insipidamente pacífica e cooperante. Ei-la, a propósito de um tema que está longe de ser estruturante: Cavaco, sedento de marcar terreno depois de mais de dois anos de cooperação silenciosa, puxou pelos galões na inoportuna comunicação ao país de Julho passado; o PS, por seu turno, insiste em não deixar cair a pleonástica audição do Presidente do Governo Regional, em sede de dissolução do Parlamento Regional, e permitiu que Carlos César viesse a público, desastradamente, falar em chantagens e insinuar uma confirmação parlamentar em caso de aposição de novo veto.
Estão assim fechados os contornos de um cenário de “medição de forças” entre Presidente da República e maioria parlamentar, habitual destas conjunturas políticas, e, por isso mesmo, pouco preocupante.
O episódio não vale por si mesmo. Vale pelo que nos permite prever quanto à evolução futura das relações institucionais entre o governo e Belém. Desde o início sabíamos que o remanso dos primeiros tempos do mandato presidencial era estratégico e que Cavaco, depois de uma campanha e de um discurso de posse onde denunciou uma tónica intervencionista, não se arriscaria a ficar para a História como um presidente mais normalizador que o próprio Sampaio.
Conhecíamos além disso, os planos que alguns dos apoiantes mais próximos faziam para esta magistratura – aguentar o governo o tempo necessário para que o PSD se fortalecesse na oposição e depois aproveitar uma crise política para acenar com a dissolução, marcar eleições e fazer o partido regressar ao poder, com um líder mais prometedor que Marques Mendes ou Menezes e depois de estes terem aguentado os tempos quentes da travessia no deserto.
Resta-nos agora saber, que tipo de intervenção o próprio decide seguir: a via mais revanchista protagonizada por alguns apoiantes? ou a via de um mero Presidente participativo? Ambas terão os seus custos, e, se escolher a segunda, Cavaco arrisca-se a ficar conhecido como um dos piores Presidentes da IIIª Republica, um dos que menos entendeu o sentido da independência associado ao exercício deste tipo de funções, e assim, ironicamente, igualar Mário Soares, que acusava de “força de bloqueio” no período final da primeira coabitação.
 
Comentários:
Realmente o governo e o presidente pareciam gémeos!
Eu diria que o presidente esteve silencioso e sossegado à espera do momento oportuno de se "revoltar".
Agora, se vai optar por uma participação mais revanchista ou mais participativa?
Pessoalmente, creio que irá optar por uma via intermédia (nem 8, nem 80), afinal ainda falta ser eleito para o 2.º mandato! Não é?
Marianne
 
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