O sacrifício de Ferreira Leite
Há pelo menos duas maneiras de um líder, recém-eleito, ganhar verdadeiramente o partido. Uma enfática, emotiva, retórica, galvanizadora no discurso e ambiciosa nos objectivos internos, apesar de estéril em ideias concretas e outra ideológica, programática, fértil em projectos e onde se denota uma “linha de rumo” para o país, mais ou menos consensual, mais ou menos exequível.
Manuela Ferreira Leite, talvez segura dos resultados que obteve nas directas, escolheu precisamente aquela que dificilmente a levará ao sucesso: um discurso plácido, tímido, em tom de conferência, povoado de generalidades mas vazio de objectivos, internos e externos, a médio ou longo prazo.
Ganhar as legislativas de 2009 é o sacrifício que Ferreira Leite se impôs a si própria, embora, ao que parece, não esteja particularmente entusiasmada em consegui-lo. E enquanto assim continuar, parece-me que se aproxima, a passos largos, um dos ciclos políticos mais complexos da nossa vida democrática: um ciclo com uma vitória estéril do PS, sem maioria, um PSD acantonado para a casa dos 20 ou 30% e a extrema-esquerda, florescente em resultados que lhe permitirão elevar o tom do discurso contestatário habitual, e dar o grande contributo à governação a que sempre nos tem habituado desde o 25 de Abril: a oposição, a crítica inconsistente e despovoada de alternativas, o incentivo à barafunda de rua, à ingovernabilidade.
Do PSD não há muito a esperar (como não houve nos últimos anos). Cabe agora ao PS, inverter o rumo do auto-fascínio pela sua governação e pelo seu estilo, da propaganda efusiva de resultados de dimensão microscópica, para se centrar, com rigor, nos problemas do país e admitir as suas fragilidades. Esperemos que seja capaz.